Gothic Station entrevistou 6 Youtubers Góticas brasileiras, mulheres e afro-descendentes e/ou periféricas: Fases da Bruxa, Antonielle Ladydark, Nayara Soares, Maryana Marques, Necrose Moor e Rubia Nosferotika sobre o preconceito e agressões que sofrem a partir de setores do próprio Underground na forma de machismo, ou racismo, em geral disfarçado em discursos de estilo. Vamos ver o que elas nos contam:
- Sobre o preconceito contra as youtubers góticas. O que você pensa sobre esse assunto?
Fases da Bruxa: Siiim, vejo muito! Já recebi comentários nos meus vídeos dizendo para sair do YouTube, que mulher não sabia falar sobre subcultura, que eu era fútil! Isso foi bem no comecinho, hoje em dia não recebo tanto! E tem o outro lado também, se eles não insultam falando que mulher não pode falar sobre a cena, eles assediam você através de comentários em vídeos de look por exemplo! Se você está mostrando um visual que contém vinil, cinta liga etc... os caras não respeitam.
Necrose Moor: Sim, infelizmente a internet está possuída por pessoas ignorantes, que acabam criticando os vídeos, sem mesmo entender o que está sendo dito. As críticas são muito intensas, e isso, as vezes, acaba desmotivando quando pretendo abordar assuntos mais sérios no meu canal.
Fases da Bruxa: Percebo que os youtubers goticos homens (que são poucos) eles não sofrem absolutamente nada! Simplesmente por ser um homem falando, se tem um homem falando sobre a cena está certo! E está totalmente errado, porque que em uma subcultura há mais mulheres do que homens, os homens tem credibilidade e as mulheres, não? Todos nós temos a liberdade de falar sobre, seja homem, mulher, amarelo, azul, branco e preto! Já recebi muito comentário absurdo mas a minha resistência é maior! Essas pessoas que praticam machismo, racismo entre outros preconceitos é complicado, porque se uma pessoa está ali empenhada, estuda para fazer roteiros, se dedica, para depois vir uma pessoa e tentar destruir aquilo que você construiu, isso é babaquisse, na minha opinião. Atrás do computador todo mundo faz o que quer, mas pegar uma câmera, gravar um video e fazer um vídeo que ele acha que vai estar melhor que o meu ou das outras meninas, ninguém faz!
- Você vê um lado de machismo ( ou de racismo ) por parte dos "under-machos" também? Você acredita que esse preconceito seja mais por você ser mulher, por ser periférica (fora dos grandes centros), por racismo, por ser uma gótica abrindo um lugar de fala sem depender de ninguém no "underground", por tratar de temáticas x ou y , ou... ?
Antonielle Ladydark: Poxa, realmente o preconceito dentro do meio de Youtubers góticas tem crescido muito nesses últimos anos. Ódio gratuito, por simplesmente passar a informação que se tem, seja sobre visual, música, maquiagem e a própria subcultura em si, é tenso demais... até pq somos seres humanos, erramos e aprendemos a toda hora. E o pior é que damos a cara a tapa, o que acarreta em situações que afetam o emocional e tals. Há uma necessidade gigante de desconstrução.
Necrose Moor: Com certeza, já recebi diversos comentários machistas, dizendo que sou mulher, e meus videos não tem credibilidade nenhuma. Em outros momentos, também fui criticada por usar maquiagem pesada (pancake branco e batom preto) e que eu deveria me envergonhar de usar o cabelo bagunçado, pois uma "mulher decente e dona dos bons costumes" deveria se arrumar e se comportar de forma mais adequada.
Antonielle Ladydark: Sabemos todos que vivemos numa sociedade completamente machista, e por incrivel que pareça, no underground quando você para pra prestar atenção acaba sendo bem pior. Porque é propagada a imagem que a mulher q anda na subcultura é o puro fetiche e visual, que está ali pra embelezar o ambiente e ser a bonequinha gótica dos sonhos dos marmanjos dos rolês. Quando abrimos a boca pra soltar conteúdo sobre a subcultura, sobre nossa visão, caem em cima dizendo q não sabemos de nada, que deveriamos nos calar.
Antonielle Ladydark: Daí quando abrimos a boca pra falar de maquiagem, visu, roupas e outras coisas, nos acusam de simplesmente estarmos sendo superficiais, e também querem que nos calemos. A vontade que dá é de mandar todos a merda, porque em um meio em que não deveria existir distinções, preconceito ou fiscal era no Underground, mas por sinal é o que mais encontramos.
Antonielle Ladydark: Agora imagina, uma mulher, gorda e negra, totalmente fora do padrão erocentralizado falando de subcultura? É um prato cheio pra esse pessoal! E se falar de política então, aí é que a situação piora, pq as ofensas e teorias mirabolantes sobre a esquerda, marxismo, comunismo é o diabo a quatro surgem pra tentar distorcer a fala e fazer com q vc pareça completamente burra! Nayara Soares: Já vi muitas meninas tendo o valor de seus conteúdos questionados justamente por abordar alguns assuntos tidos como femininos. É como se uma moça que fala sobre maquiagem não tem capacidade de falar sobre música, por exemplo. Ridículo isso! Sei de meninas que evitam falar sobre a subcultura, por exemplo, para não serem apedrejadas. - Chegou a esse ponto? Nayara Soares: Tem uma amiga minha do Instagram que começou um canal a um tempo atrás, o nome era Gótica de cidade pequena, aí um cara super babaca, que eu nem sei se era de alguma subcultura, fez um vídeo e fez muita chacota com ela. Depois disso ela até trocou o nome do canal, largou um pouco de lado a subcultura gótica... Maryana Marques: Eu penso que infelizmente somos muito sexualizadas, achei ótimo você vir falar comigo porque estava pensando nesse tema para voltar a gravar. Falar sobre o preconceito, no geral. Por sermos diferentes as pessoas tem esse preconceito já enraizado. Infelizmente temos que ganhar nosso respeito. - Você acredita que esse preconceito seja por você ser mulher, por ser periférica (cidade pequena), por ser uma gótica abrindo um lugar de fala sem depender de ninguém, por tratar de temáticas x ou y , ou... ?
Necrose Moor: Eu acho que isso deveria ser conversado abertamente, pois vejo que os homens "são privilegiados" quando produzem conteúdos para o YouTube. E nós, Youtubers Góticas somos discriminadas (até mesmo por outras pessoas, dentro da cena) por dizer que, estamos utilizando a plataforma para "chamar atenção".
Maryana Marques: Por tudo isso. Que no meu canal eu gosto de falar sobre esse tipo de assunto, sempre dou um jeito de falar sobre. E infelizmente a mulher não tem voz, ela é apenas fetichizada por ser alternativa. E acham góticos só dever fazer coisas góticas. E acho que em cidades pequenas o preconceito é bem maior. - Sobre o preconceito do "udigrúdi" contra as youtubers góticas/alternativa. O que você pensa sobre esse assunto? Você acredita que esse preconceito seja mais por...? Rubia Nosferotika: Eu acho que é por ser mulher, porque se um homem fala que curte ouvir as mesmas coisas que escuto ele é respeitado, e se eu falo as coisas que escuto sou imediatamente diminuída por isso. Acho que existe uma hierarquia desnecessária onde pra você ser respeitado no meio você precisa ser inalcançável: conhecer as bandas mais underground, falar as palavras do jeito mais difícil, usar as roupas menos acessíveis (sejam elas por meio de uma loja que é difícil de comprar ou por DIY, que é uma expressão mais única, mas no gótico existe esta represália de que se você não tá fazendo diy e sim comprando de lojas alternativas, você não é merecedor de respeito). Rubia Nosferotika: Também existem as críticas de que gótico não é visual que são extremamente válidas, mas as vezes o acesso que alguém tem pela subcultura é primeiro o visual e posteriormente a música, e se a pessoa chega na música do mesmo jeito, se ela acaba gostando do core da subcultura do mesmo jeito, por que faz tanta diferença ela ter se interessado pelo visual antes de se interessar pela música?
Rubia Nosferotika: Quando a gente fala de elitismo, a gente fala de controle. Assim como a sociedade e a grande mídia controla as mulheres através do padrão de beleza, e ai de você se você quiser ser bonita e inteligente ao mesmo tempo, o elitismo no meio alternativo faz exatamente a mesma coisa: você não pode gostar de passar uma maquiagem ou usar a roupa que você gosta, porque isso é futil. Esse controle vem dos homens desde sempre, porque uma mulher controlada não contesta e mantém a máquina de poder masculino girando, mas é reproduzido pelas mulheres que sentem necessidade de se encaixar ou de serem aprovadas por homens. Rubia Nosferotika: Ao mesmo tempo que os góticos reclamavam da TV que estigmatizou que gótico é depressivo, bebe sangue em crânios no cemitério e escuta Evanescence, eles também não aceitam que existem pessoas com a ascensão das mídias sociais que tentam desestigmatizar essa cultura tão marginalizada e deixam tão acessível pra quem não conhece nada, e (eles) tentam puxar essas pessoas pra baixo fazendo comentários que só despedaçam o pouco que existe da cena. Ao mesmo tempo que eles exigem ser humanizados, tentam fazer uma manutenção dessa demonização que sofrem falando mal das pessoas que estão tentando democratizar a cultura.
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Obrigado a todas pelas entrevistas! Abaixo os canais das entrevistadas, em que podemos encontrar conteúdos de qualidade sobre diversos aspectos da subcultura gótica e outros assuntos:
Se você tem algum depoimento sobre esse assunto, nos escreva no insta, face ou e-mail: henrique_kipper@yahoo.com
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